Construindo o Chão no Corpo: A Importância dos Bandhas nas Práticas de Yoga
- Fernanda Mendes
- 3 de set. de 2024
- 6 min de leitura
Há uma terra sagrada dentro de cada um de nós, um solo fértil onde raízes energéticas se entrelaçam e sustentam a nossa existência. Construir um chão no próprio corpo é um ato de profunda criação, e os bandhas são as ferramentas que nos permitem tecer esse tapete invisível de força e presença. Esses “fechos” ou “travas” energéticas atuam como âncoras, ajudando a estabelecer um chão firme no próprio corpo.
O que são os Bandhas?
Bandhas são técnicas de contração muscular que bloqueiam e redirecionam o fluxo de prana (energia vital) em determinadas áreas do corpo. Três principais bandhas:
Mula Bandha: O Fecho da Raiz
Mula Bandha é o primeiro toque do criador, onde o corpo se enraíza na terra. Como as raízes de uma árvore que se aprofundam no solo em busca de nutrientes, ativar este bandha é despertar a fundação do ser. É sentir a terra sob os pés mesmo quando estamos suspensos no ar, uma ancoragem que nos lembra de onde viemos e para onde sempre podemos voltar. Mula Bandha é a segurança que nos permite crescer com coragem.
Como fazer - Ele envolve a contração dos músculos do assoalho pélvico, ajudando a elevar a energia da base da coluna e a estabilizar o corpo e a mente.
Como Praticar Mula Bandha
Encontre uma Posição Confortável:
Sente-se em uma postura meditativa, como Sukhasana (Postura Fácil) ou Padmasana (Postura de Lótus), com a coluna ereta. Você também pode praticar Mula Bandha deitado de costas em Savasana (Postura do Cadáver).
Certifique-se de que seus ombros estão relaxados e que sua respiração é suave e natural.
Concentre-se no Assoalho Pélvico:
Feche os olhos e direcione sua atenção para a base da coluna, na região do períneo. O períneo está localizado entre o ânus e os órgãos genitais.
Contraia os Músculos do Assoalho Pélvico:
Lentamente, contraia os músculos do assoalho pélvico. Para identificar os músculos certos, imagine que você está interrompendo o fluxo de urina. Essa é a contração que você deseja manter.
A contração deve ser firme, mas não forçada. Evite tensionar outras partes do corpo, como o abdômen, as pernas ou os glúteos. A intenção é isolar o movimento no assoalho pélvico.
Mantenha a Contração:
Segure a contração por alguns segundos, mantendo uma respiração suave e constante. No início, tente segurar por 5 a 10 segundos. Com a prática, você poderá aumentar esse tempo.
Ao exalar, libere a contração lentamente e sinta a energia se espalhando pela coluna.
Repetição:
Repita a prática várias vezes, conforme for confortável. Com o tempo, Mula Bandha pode ser incorporado em várias posturas de yoga e durante a meditação.
Integre com a Respiração: Inicialmente, pratique Mula Bandha durante a exalação, o que pode facilitar a ativação. Com a prática, você poderá manter Mula Bandha durante toda a respiração.
Uddiyana Bandha: A Elevação da Energia
No centro do corpo, Uddiyana Bandha nos convida a elevar a energia, como um rio que corre de volta à fonte. Este bandha puxa o prana do ventre profundo e o dirige ao coração e além, criando uma corrente de vida que nos sustenta em cada respiração. Ao ativar Uddiyana Bandha, o corpo se torna leve como uma pluma, mas forte como a rocha, permitindo que navegemos pelas ondas da vida com equilíbrio e graça.
Como Praticar Uddiyana Bandha
Escolha uma Posição Confortável:
Comece em pé, com os pés afastados na largura dos quadris e os joelhos levemente flexionados, ou sente-se em uma postura confortável como Sukhasana (Postura Fácil). Se estiver de pé, incline-se ligeiramente para frente, colocando as mãos nos joelhos para suporte.
Mantenha a coluna ereta e o peito aberto, com o queixo ligeiramente inclinado em direção ao peito (praticando simultaneamente o Jalandhara Bandha, se desejado).
Exale Completamente:
Expire profundamente, esvaziando completamente os pulmões de ar. Isso cria um vácuo natural no abdômen, facilitando a elevação dos músculos abdominais.
Crie uma Retração Abdominal:
Com os pulmões vazios e a respiração suspensa, puxe a barriga para dentro e para cima em direção à coluna. Isso cria uma cavidade ou concavidade no abdômen, com o diafragma sendo sugado para cima.
Evite inalar durante este processo; a retenção da respiração é fundamental para a prática correta de Uddiyana Bandha.
Mantenha a Posição:
Segure essa contração por alguns segundos, mantendo a respiração suspensa (apneia). No início, você pode conseguir segurar por apenas alguns segundos, mas com a prática, pode aumentar gradualmente o tempo.
Enquanto mantém o fecho, sinta a elevação da energia ao longo da coluna, como se estivesse subindo desde o abdômen até o peito.
Liberar o Bandha:
Quando estiver pronto para liberar, relaxe lentamente os músculos abdominais, permitindo que o abdômen retorne à posição natural.
Inale suavemente para preencher os pulmões novamente e relaxe.
Repita a Prática:
Você pode repetir Uddiyana Bandha por várias rodadas, conforme o tempo e o conforto permitirem. Comece com 3 a 5 rodadas e aumente conforme sua prática evolui.
Dicas para Iniciantes
Pratique em Jejum: Uddiyana Bandha é melhor praticado com o estômago vazio, de preferência nas primeiras horas da manhã. Evite praticá-lo logo após comer.
Comece com Suavidade: No início, não se preocupe em criar uma contração muito intensa. Concentre-se na técnica e na sensação de elevação gradual da energia.
Integre com Outros Bandhas: Uddiyana Bandha pode ser combinado com Mula Bandha e Jalandhara Bandha para aprofundar a prática e intensificar os efeitos energéticos.
Jalandhara Bandha: O Fecho da Garganta
Jalandhara Bandha é o portal que une o coração e a mente, uma ponte onde a energia flui em harmonia. Ao trazer o queixo em direção ao peito, criamos um selo sagrado que protege e direciona a corrente de prana. Este bandha é o guardião da clareza, permitindo que a mente se acalme e o espírito se expanda. É o silêncio antes da palavra, a calma que precede o movimento.
Como Praticar Jalandhara Bandha
Escolha uma Posição Confortável:
Sente-se em uma postura meditativa confortável, como Sukhasana (Postura Fácil) ou Padmasana (Postura de Lótus), com a coluna ereta e as mãos descansando nos joelhos.
Você também pode praticar Jalandhara Bandha enquanto está de pé em Tadasana (Postura da Montanha).
Inspire Profundamente:
pelo nariz, enchendo os pulmões completamente. Segure o ar dentro de seus pulmões, mantendo a respiração em suspensão (kumbhaka).
Baixe o Queixo:
Enquanto mantém a respiração suspensa, abaixe suavemente o queixo em direção ao peito, formando uma curva suave no pescoço. Esta ação cria uma leve pressão na garganta, fechando a passagem de ar parcialmente.
Certifique-se de manter a coluna ereta e os ombros relaxados. Evite tensionar os ombros ou inclinar-se para frente.
Contraia a Garganta:
Sinta uma leve contração na garganta enquanto mantém o queixo abaixado. A pressão deve ser suficiente para bloquear parcialmente o fluxo de ar e criar um "selo" energético na área da garganta.
Mantenha essa contração enquanto segura a respiração, direcionando a energia para baixo em direção ao coração e para cima em direção à cabeça.
Mantenha a Posição:
Segure Jalandhara Bandha pelo tempo que for confortável, normalmente durante a retenção da respiração (kumbhaka).
Quando estiver pronto para liberar, levante suavemente o queixo e exale lentamente pelo nariz.
Repita a Prática:
Você pode repetir a prática várias vezes, conforme o tempo e o conforto permitem. Com a prática, você se sentirá mais à vontade em manter Jalandhara Bandha por períodos mais longos.
Construindo o Chão Interior
O corpo dança em sua própria arquitetura sagrada. Através deles, construímos um chão interior que não é apenas uma base física, mas um campo energético onde cada movimento é sustentado por uma força invisível, mas palpável. Este chão é a nossa âncora em meio às tempestades, a nossa estabilidade em tempos de incerteza.
Praticar os bandhas é cultivar um jardim interno, onde a energia floresce e a vida encontra equilíbrio. É tecer um chão onde podemos repousar em segurança, onde a mente pode se aquietar e o coração pode se expandir. É no silêncio deste chão que ouvimos a verdade do nosso ser, a sabedoria que emerge quando estamos profundamente conectados com a nossa própria essência.
Na prática dos bandhas, encontramos a poesia do corpo, a arte de criar um espaço sagrado onde podemos caminhar com confiança e leveza. O chão que construímos dentro de nós mesmos é o alicerce para tudo o que somos e para tudo o que ainda podemos ser. Que a cada ativação dos bandhas, possamos sentir essa presença, essa criação contínua de um chão que nos sustenta e nos eleva, guiando-nos com firmeza e suavidade pela jornada da vida.
Com amor, Fernanda.
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